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sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

O certo, o errado, e eu

Você já teve a sensação de estar ficando maluco, por ter que explicar coisas óbvias, enquanto coisas absurdas parecem ser aceitas como normais?

Nossos políticos em Brasília são uma fonte inesgotável de exemplos assim: o sujeito é flagrado enfiando dinheiro de propina nas meias, e justifica, de forma muito simples: "só coloquei nas meias porque não uso mala". Pronto! tá tudo explicado! - Ele nem se dá o trabalho de negar a acusação!!!

Mas não quero aqui falar da (i)moralidade na política. O que realmente me assusta é a inversão de padrões morais em nosso dia-a-dia.

Apenas como exemplo, para iniciar minha reflexão, vou retomar (agora que a discussão já esfriou) o caso da estudante da Uniban, que quase pôs a universidade abaixo por causa de um vestido curto.

A estudante virou celebridade nacional, com entrevistas em horário nobre e destaque em capas das principais revistas. Durante 15 dias, esse parecia ser o assunto mais importante no país: todos queriam opinar se a moça tinha ou não o direito de usar um vestido curto dentro da universidade, se os estudantes tinham ou não o direito de provocar aquele ataque, e se a instituição tinha ou não o direito de expulsar a estudante. Ao final de toda a discussão... quem estava certo? e quem estava errado? alguém sabe? - alguém se importa?

Esse debate terminou exatamente como começou: cada um com sua opinião, baseada em nada, sem uma conclusão mais ampla. O que acontecerá, por exemplo, quando um aluno resolver assistir aula sem camisa? teremos toda essa polêmica novamente? o que aprendemos nesse debate?

Para mim, a conclusão é simples: todos estavam certos, em princípio, mas todos agiram de forma errada (ouch?! - isso é possível???), mas meu foco, aqui, não é discernir o que é certo ou errado.

Esse texto trata da aparente falta de interesse (ou coragem) em discutir seriamente cada questão, e chegar a conclusões. Perdidos na polêmica vazia entre o certo e o errado, onde relativizamos todos os valores, talvez como forma de libertação dos padrões absolutos impostos pelo regime militar de outrora, estamos caindo num outro tipo de regime absolutista: uma sociedade amoral, onde "é proibido proibir" - e também questionar, criticar, opinar...

Confundimos Democracia com Anarquia, Autoridade com Autoritarismo... condenamos todo tipo de norma, regra ou padrão (moral?) como algo absolutamente inaceitável, e aceitamos a banalização e relativização de tudo, como algo natural. Nesse cenário, onde o sofisma subjuga a lógica, todos os argumentos passam a ser válidos.

Sou professor, e sempre que questiono a utilidade e a relevância daquilo que estamos ensinando, recebo dos colegas respostas do tipo: "Todos nós estamos aqui, dando o nosso melhor, cumprindo nossos horários, seguindo os conteúdos... e vem você questionar a qualidade de nosso trabalho?!?! - quem você pensa que é??? - pensa que é melhor que os outros???"

Pois é... aí eu tenho que justificar o óbvio...

É possível produzir uma educação medíocre, mesmo cumprindo todo o conteúdo e carga horária. Educação é um processo coletivo, onde a soma de disciplinas (desconexas) não resulta, necessariamente, numa formação integrada. E por aí vai...

Todos sabem que a qualidade do que fazemos é ruim, mas... quem pode provar? Diante de qualquer crítica, citamos nossos currículos! "Somos mestres, doutores, especialistas! - como nosso trabalho pode ser ruim?". Nada é mais cansativo que ter que justificar o óbvio... Nada é mais desesperador que ver a lógica se dissolver em meio ao sofisma...

Felizmente, quando me vejo perdido nesse caldeirão, onde o certo e o errado se misturam, e onde é proibido questionar, posso contar com a lembrança da sábia definição, deixada por meu pai:
"Certo é tudo aquilo cujas consequências você pode encarar de cabeça erguida."
Pronto. Isso me basta para seguir em frente.

PS: É claro que, quando meu pai falava em "cabeça erguida", ele não era capaz de imaginar a cara-de-pau que as pessoas têm, para defender de cabeça erguida o indefensável. Assim, a definição ainda me é suficiente.

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